Conheça Kronos

Zero

 Um dia uma sábia senhora me disse que o tempo era uma questão de entendimento. Eu entendi que eu podia controlá-lo, talvez não, talvez fosse difícil demais achar uma forma que conseguir isso, mas quando você perde alguém que ama você quer reviver a qualquer custo isso de novo. Talvez a morte não seja o fim. Porque às vezes o fim é o começo. Tudo é uma questão de tempo...
27 de Novembro
O: 30
 Quando acordei senti a chuva fria em meu rosto, minhas costas doíam, parecia que eu havia caído do maior prédio da cidade, eu estava morto? Mal me mexia, a rua estava vazia, estava muito mais frio, eu vestia aquele casaco vermelho que ganhei da tia Sarah ano passado, era melhor ir pra casa, mamãe devia estar preocupada, Alana precisava ir pra casa. Não passavam carros, as poças só aumentavam, logo percebi que estava perto da escola, isso me deixava a quatro quarteirões de casa. A chuva ficou mais grossa, o casaco parecia pesar uns 70 quilos, eu iria cair a qualquer momento.
 Cheguei a minha rua já perdendo o restinho de energia que me restava. Vi o Seu Pedro, o porteiro, dormindo enquanto na TV passava algum filme antigo, preto e branco. Molhei o tapete do elevador, aliás, todo o corredor também. Cheguei em casa, meu celular não estava no meu bolso, nem a chave, peguei a reserva embaixo da planta murcha em frente a porta. Sujei-me de terra, limpei a mão na calça, senti que estava rasgada, alguém me estrupou?!
- Mãe?
 Silêncio total. Ouvi uma porta mexer. O celular da Alana estava sobre a mesinha ao lado das fotos de família.  Vi-me no espelho, meus usuais fios meio alaranjados, deram lugar a um cabelo preto sujo e molhado.  Haviam pegados de água até o sofá, mamãe ia me matar...
- Oi Bob! – disse Alana surgindo da cozinha.
 Pensei que Alana ia me matar, eu estava 3 horas atrasado. Ela já devia estar em casa, ligando pra amigas ou pro advogado pra falar sobre a separação repentina, ela me odiava, eu sentia isso. Eu era o culpado.
- Senta querido! – disse ela calmamente pegando uma xícara e botando o café frio que estava sobre a mesa.
- Cadê minha mãe?
 Ele me soltou um olhar arrebatador de uma tristeza incomum. Senti algo estranho, não quis entender. Ela estava muito calma, o cabelo loiro estava amarrado pra trás, os belos olhos verdes, estavam vermelhos e inchados, o vestidinho de boneca lilás parecia, mais bagunçado que o normal, ela sempre estava impecável, não agora.  Escondeu um copo pela metade de uísque, não estava bêbada, estava aterrorizada. Não conseguia falar.
 Quando sai de tarde ela estava tão feliz, falando com a mamãe sobre uma futura viagem para Mônaco, mamãe mal respondia as perguntas sobre roupas e colares, estava quase dormindo. A casa estava clara, não chovia há meses. Agora estava nebulosa, escura e fria. A chuva veio levando toda a paz rotineira da minha vida. Eu não me lembrava como cheguei naquela rua, como cai no chão.
- A sua mãe Bob...
- Diz logo...
 Fiquei branco, mais que o normal, eu tremia compulsivamente, o barulho da chuva incomodava, diferentemente de quando isso acontecia na chácara, lá era lago leve e bonito, eu chegava a dormir, a ficar mais tranqüilo. Não hoje, não aqui, não agora... O relógio mostrava 1h 15minutos.
- Ela morreu...
 A boca dela tremeu por alguns segundos mesmo depois de ter dito. Eu parei. Não escutei mais a chuva. Me senti sozinho no mundo. Meu Deus! Entendi como minha mãe se sentiu no dia que a vovó morreu, era o fim. O relógio parou. Eu era um menor abandonado agora. Doía muito. Perdi a pessoa que eu mais amei e que mais me amou. Minha companheira. Minha base. Tudo!
 Eu? Eu sou Bob Hael Castro, e essa é a história da minha vida. A história do dia em que eu morri...


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